quinta-feira, 10 de maio de 2007

172 - Sabores e Cores


A beleza é um acordo entre o conteúdo e a forma.
Henrik Ibsen
(Dramaturgo norueguês)


Os olhos deviam aprender
com a razão.
Johannes Kepler
(Astrônomo alemão)


Nossos sentidos nos enganam ou são insuficientes
quando se trata de análise, observação e apreciação.
Pierre Bonnard
(Pintor francês)




O prazer, a intensidade emocional e a beleza estética de uma partida de Go não estão vinculados ao resultado da disputa. Ilusório é o apego à vitória ou ao sofrimento da derrota. A primeira cria a vaidade da superioridade técnica. A segunda a dor da humilhação intelectual. Eles estão vinculados à construção da partida. Processo único e irreversível. Fruto da ação de duas mentes. Construtoras de idéias, conceitos, conjecturas e problemas/soluções.

Elementos construtivos da partida, as pedras se combinam para gerar formas e espelhar o fluxo criativo dos jogadores. Cada momento da partida é rico em possibilidades. A materialização do planejamento e das ações táticas não depende exclusivamente dos agentes construtores, os goístas que disputam a partida. Resulta da característica da posição(*) existente sobre o tabuleiro e o nível técnico dos jogadores.

Contudo, o goísta ao realizar um bom movimento ou seqüência de movimentos sente uma grande satisfação e prazer. Pois percebe o fato como fruto de seu esforço e dedicação. E isso independe do resultado da partida. Esse fenômeno é percebido mais claramente nas partidas em que o jogador, mesmo realizando excelentes movimentos, perde a partida em decorrência da qualidade técnica do oponente. A partida foi perdida, mas a satisfação de ter jogado bem é intensa e gratificante. E muitas vezes supera a emoção da vitória conquistada numa partida medíocre e eivada por erros e lances fracos.

Vejamos alguns exemplos de momentos prazerosos, que independem do resultado da partida. Momentos fugazes como a vida, mas que guardam em suas entranhas o sentido e o valor do que é essencial.

Quem nunca sente satisfação quando numa partida:

- consegue perceber o momento exato de deixar inoperante um grupo de pedras grande ou de valor estratégico?

- escolhe deixar viver pequeno, para obter vantagem posicional, superando a ganância (existindo a possibilidade de ganho de material – a captura das pedras adversárias)?

- vence uma longa batalha de ko devido à leitura correta da posição (análise) ou a descoberta de um lance sutil ganhador?

- constrói problemas complexos e inesperados, que exigem do oponente muita reflexão e resposta correta?

- realiza um sabaki eficiente e do “nada” produz poder ou território?

- destrói um grande moyo, de forma totalmente inesperada para o adversário?

- estando inferiorizado na partida, consegue opor grande resistência às tentativas do adversário de obter uma vitória esmagadora; e reverte a vantagem de pontos do oponente em derrota por pontuação mínima (0,5 pontos) – ou até transformando a derrota em vitória?

- invade (ou reduz) com sucesso uma área do tabuleiro bem defendida pelo adversário?

- disputada contra um jogador tecnicamente mais forte, responde de igual para igual todos os ataques do oponente, sem medo ou indecisão?

- descobre o ponto vital de um grupo adversário, após um longo e acurado exame das variantes?

- após uma luta árdua, consegue uma posição de seki, salvando assim pedras importantes para a pontuação final da partida?

- estabiliza um enorme grupo flutuante ameaçado de captura e vagando sobre o tabuleiro?



Nota Técnica

(*) Característica da posição: Formas, espaços, a energia – poder/potencial de trabalho das pedras, como as propriedades das linhas e áreas interagem com as pedras, o fluxo energético, campo de influência local e campo de influência distante, o campo de interferência das energias, o equilíbrio de material, etc.